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Proposta de autonomia da Polícia Federal divide especialistas

por Editoria Delegados

Com opinião do delegado Henrique Hoffmann

O anúncio de desarquivamento de Proposta de Emenda à Constituição que trata da autonomia da Polícia Federal para ser votada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados tem gerado debate e dividido entendimentos de juristas.

Os especialistas se baseiam em uma decisão do presidente da CCJ, deputado Felipe Franceschini (PSL-PR), que desengavetou a proposta de autonomia da PF, reivindicação da categoria que estava parada na Casa havia dez anos.

A retomada do debate a respeito da PEC, depois de declarações polêmicas do presidente Jair Bolsonaro de que quem manda na PF é ele, também gera polêmica na Câmara e divide parlamentares que, nos bastidores, não querem “fortalecer” a categoria neste momento.

Para o jurista e colunista da ConJur Lenio Streck, entretanto, nenhum país democrático concede autonomia à polícia. Segundo ele, não há precedente.

“Novamente o Brasil quer fazer atalhos. Traição no casal? Simples: compra sofá novo. Não tem como funcionar um sistema de investigação com polícia e MP autônomos ao mesmo tempo. Este é um país das autonomias. Neste ritmo, logo outras instituições quererão autonomia. Bom, em filosofia se diz: se tudo é, nada é! Ou: se todos são autônomos, já ninguém será. Governos já de nada valerão. O eleito estará submetido a um poder autárquico representado pela estrutura estatal autônoma. Cuidado, pois”, afirma.

Para o criminalista Thiago Turbay, o desenho institucional da Polícia Federal prescreve dependência com o poder executivo, que é quem exerce e executa políticas de segurança. “Torná-la autônoma poderá desalinhar o controle e o poder de polícia judiciária, portanto, qualquer medida nesse sentido deve ser exaustivamente discutida. Mais importante é a transparência nesses órgãos e o controle público de suas ações. Parece-me mais salutar para o bom funcionamento da polícia a sanção da lei de abuso de autoridade do que uma eventual PEC, no tocante à legalidade das suas ações”, explica.

Autonomia Imposta

Para Fernando Castelo Branco, criminalista e professor de pós-graduação de direito penal e econômico da Escola de Direito do Brasil (EDB), mais uma vez, a incontinência verbal de Bolsonaro interfere e afeta as instituições.

“Na minha avaliação, a Polícia Federal tem autonomia e dever imposto pela Constituição na capacidade de investigação criminal nas práticas de crimes de competência federal ou estadual. Dentro desse panorama, o que se busca é uma forma minimamente alternativa para que o diretor da PF seja escolhido, nos moldes do que já acontece na PGR, por exemplo.”

Para o delegado e colunista da Conjur, Henrique Hoffmann, a autonomia da Polícia Judiciária, que abrange tanto a Polícia Federal quanto a Polícia Civil, é fundamental.

“A Polícia Investigativa tem a missão constitucional de descobrir a verdade de forma imparcial, possibilitando denúncias robustas e evitando acusações temerárias, tanto com relação à delinquência de rua, como no que tange à criminalidade de colarinho branco. Sem esta garantia, a Polícia Judiciária é sistematicamente negligenciada nas escolhas do Poder Executivo, o que impossibilita o regular curso das investigações e gera impunidade. Nessa vereda, a autonomia representa a barreira contra caprichos dos governantes, evitando o sucateamento da Instituição e impedindo que esse órgão de Estado seja transformado em órgão de governo”, diz.

Segundo o advogado Willer Tomaz, a autonomia da Polícia Federal está mais alinhada com a Constituição Federal e evita interferências externas à atividade policial.

“A Polícia Federal desempenha com exclusividade o papel da polícia judiciária no âmbito federal. Conferir-lhe autonomia administrativa e funcional nos parece uma escolha mais alinhada à Constituição, bem como mais harmônica com a ideia de uma polícia de estado, imune que deve ser a interferências externas de caráter político”, explica.

João Paulo Martinelli, advogado criminalista, afirma que o projeto diminui a influência do ministro da Justiça e do presidente da República sobre a estrutura Polícia Federal.

“Os policiais poderão ter maior estabilidade nas investigações, com risco menor de serem retirados de investigações que possam incomodar pessoas influentes. Atualmente, tanto a Polícia Civil quanto a Polícia Federal sofrem modificações e ficam à mercê do poder executivo”, diz.

Segundo a advogada constitucionalista Vera Chemim, a PF é um órgão que necessita de autonomia e não se admite qualquer tipo de ingerência política que possa a vir prejudicar a sua atuação.

“Crimes de alta complexidade fazem parte do seu dia a dia, além de atos ilícitos predadores do Estado como a corrupção traduzida principalmente no enriquecimento ilícito decorrente do oferecimento de vantagens a terceiros, cuja prática não pode ser objeto de pressões de qualquer natureza e muito menos, do Chefe de Estado e do Governo, cujo cargo representa, antes de tudo, a prática de uma administração direcionada ao rigoroso respeito aos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais”, diz.

Debate reaceso

A CCJ reacendeu o debate no mesmo dia em que o presidente Jair Bolsonaro disse, na semana passada, que poderia trocar o diretor-geral do órgão e que quem indicava era ele, não o ministro da Justiça, Sérgio Moro, a quem a PF é subordinada. A declaração do presidente revoltou integrantes da PF, que rejeitam interferência política no órgão.

Revista Consultor Jurídico

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