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Delegado e advogados não acreditam em perdão judicial para o pai da menina que caiu do 12º andar; entenda

por Editoria Delegados

SP: Isenção da pena costuma ser considerada em caso de homicídio culposo, quando não há intenção em matar. O então responsável pela vítima foi preso por abandono de incapaz com resultado morte.

Pequena Rafaella morreu após cair de uma varanda no 12º andar

Um comerciante, de 39 anos, foi liberado em uma audiência de custódia [com um juiz] após ser preso por abandono de incapaz com resultado de morte. A filha dele, de 6, morreu ao cair do 12º andar de um prédio, no bairro Canto do Forte, em Praia Grande, na madrugada de sábado (11). Ao g1, o delegado do caso e dois advogados disseram que quando há abandono de incapaz dificilmente é concedido o perdão judicial.

O delegado Alexandre Comin explica que o juiz que liberou o pai não deu nenhum tipo de sentença, apenas permitiu que o indiciado possa responder em liberdade. Para isso, no entanto, ele deve cumprir uma série de condições, como comparecer bimestral em juízo para informar as atividades.

“Ele [o juiz] não entrou em nenhum tipo de mérito a respeito da pena. Esse perdão judicial seria uma isenção de pena, mas não tem nada a ver com abandono de incapaz, e sim com homicídio culposo [sem intenção de matar]. Nessa situação, [de homicídio] quando a pena do sofrimento do agente é muito maior do que a pena criminal, o agente fica isento da pena criminal, mas é para homicídio culposo e ele [o pai da menina] foi enquadrado no crime de abandono de incapaz com resultado morte, que não prevê isso”, ressalta Comin.

O delegado destaca ainda que o juiz pode deslocar o crime de abandono de incapaz para homicídio culposo, “caso entenda que a conduta não foi de abandono”.

O advogado Thyago Garcia segue a mesma linha do delegado Comin. Ele ressalta que o crime de abandono de incapaz, em tese, não admite a modalidade culposa, já que, para concretização do crime, é necessária a intenção de abandonar.

“Não há nenhum elemento fático que permita concluir que o pai não tinha a intenção de abandonar a vítima, de modo que nestes casos, segundo a jurisprudência dominante, é incabível o reconhecimento do referido instituto. No mais, o caso trata-se do suposto crime de abandono de incapaz onde, em tese, não se há previsibilidade de perdão judicial como causa de extinção da punibilidade. De toda forma, temos que reconhecer que há diversos julgados no sentido oposto também”, disse.

Garcia afirmou que não é impossível que o pai da menina consiga perdão judicial, mas que é algo difícil de ocorrer. “Nesse caso o juiz analisa o caso, reconhece o crime assim como a culpabilidade do agente, mas, em seguida concede o perdão judicial, julgando extinta a punibilidade, sob a premissa de que o acusado já sofreu o suficiente diante da sua própria negligência”.

O advogado Fabricio Posocco reforça que o perdão judicial só é aplicado quando tem homicídio culposo. “O vínculo afetivo é muito levado em consideração quando se fala em perdão judicial. Significa, na verdade, que o próprio estado que faz a punição renuncia da aplicação da pena daquele crime”.

“A grande discussão sobre essa questão de aplicação judicial é que o perdão judicial só está previsto nessas situações legais, ou seja, seria aplicável nos crimes de homicídio e lesão corporal culposa, então existem algumas discussões, se poderia ser aplicado nesse caso específico [do pai]”, disse Posocco.

Ainda de acordo com o advogado, a defesa do comerciante irá discutir se existe ou não a possibilidade, porém é algo que ficará à critério do magistrado. “À primeira vista, analisando friamente o caso, salvo o melhor juízo, essa ideia de aplicação do perdão judicial para esse caso em especial não será permitida por ausência de previsão legal objetiva, mas aí a defesa da tese dos advogados vai poder fazer toda uma tese de argumentação e quem sabe convencer o magistrado de modo diferente se for o caso”.


O que é audiência de custódia?

A audiência de custódia consiste no direito que todo preso tem de ser levado à presença de uma autoridade judicial em um prazo de 24h contados da data da prisão.

Esse procedimento serve para avaliar as circunstâncias em que a prisão foi realizada e para examinar os aspectos de legalidade formal e material do auto de prisão. “Vão ter que observar como essa prisão foi feita, se está legalmente formal, se todos os requisitos da lei foram observados”, disse Posocco.

O advogado acrescenta que essa audiência, inclusive, é obrigatória em todas as modalidades de prisão e não apenas nos casos de flagrante. “Ela tem que acontecer, por base na lei, em todas as modalidades, ou seja, aconteceu uma prisão, o preso tem que ser levado à presença do juiz”, disse.

Para o advogado, o pai da criança de 6 anos que morreu após cair do 12º andar foi liberado durante a audiência de custódia porque os requisitos do art. 312 do Código Penal não estão presentes nesse caso, por isso, ele não precisa aguardar preso até o final do julgamento.

“Ele deve ser uma pessoa primária, com bons antecedentes, não tem envolvimento com o mundo do crime, não coloca em risco a sociedade, não coloca em risco o próprio processo, como ameaçar testemunhas e sonegar provas”, afirmou.

Posocco enfatiza que a liberação durante a audiência de custódia não torna a pessoa isenta do crime. Assim que o inquérito policial for concluído será encaminhado ao Fórum e um promotor de Justiça vai avaliar se oferecerá ou não a denúncia para que o processo penal comece a correr no judiciário.

A advogada Diane Aguiar Ribeiro avaliou que a própria ausência de intenção pelo resultado de morte pode ter sido considerada pelo juiz ao não optar pela decretação da prisão preventiva do comerciante. “Bem como o fato do acusado não ter oferecido resistência à prisão em flagrante e ter colaborado com as investigações. Se o acusado for réu primário e não possuir antecedentes criminais, também será considerado para a aplicação de medida cautelar diversa”.

No entanto, Diane ressaltou que o fato dele ter sido liberado durante a audiência de custódia não significa que foi perdoado judicialmente. “Significa que ele irá responder o processo em liberdade, mas poderá ser novamente preso em caso de condenação”. Entenda o caso

Uma criança de 6 anos morreu após cair do 12º andar de um prédio na madrugada deste sábado (11), no bairro Canto do Forte, em Praia Grande, no litoral de São Paulo. O caso ocorreu na Avenida Castelo Branco. Segundo apurado pelo g1, o pai da menina foi liberado em audiência de custódia após ser preso por abandono de incapaz com resultado de morte.

De acordo com a Polícia Civil, o comerciante de 39 anos ausentou-se do local para levar a namorada dele, de carro, até a casa dela e deixou a filha dormindo sozinha no apartamento.

A menina acordou, ficou desesperada ao ver que estava sozinha e gritou pedindo socorro na sacada do apartamento, momento em que caiu do 12º andar. A criança caiu no piso superior do estacionamento do prédio, não resistiu aos ferimentos e morreu no local.

g1

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